Escola sem recreio

Li uma vez que nos Estados Unidos existe uma lei que obriga que as escolas tenham pelo menos 15min de recreio 3 vezes na semana, ou 20min 2 vezes na semana, para o primeiro ano do fundamental (ou seja, crianças de 6 ou 7 anos de idade). Porque antes da lei, nem isso estava sendo dado para as crianças, numa tentativa de otimizar/maximizar o tempo de aula.

Não tenho certeza sobre a veracidade desse fato, mas é uma realidade perceptível que as escolas particulares no geral estão se tornando cada vez mais conteudistas e vendendo para os pais a promessa de que transformarão suas crianças em gênios, não apenas nas matérias curriculares padrões, mas também aprendendo 2 ou as vezes 3 idiomas, robótica, computação, etc... E, claro, cada vez a criança tem menos tempo de recreio, pois seu tempo todo foi tomado por aulas atrás de aulas, atividades atrás de atividades, de forma a enfiarem em seus cérebros o máximo de conteúdo possível...

Eu realmente me horrorizo ao pensar em crianças tão pequenas (ou mesmo nas maiores) presas em salas de aula, com tempo cada vez mais reduzido para serem livres. Apesar disso, a escola dos meninos não tem recreio; nem um minuto sequer. E embora isso pareça uma contradição, explico porque não é: O recreio é tão essencial na escola convencional porque é o período em que as crianças podem ser livres e exercerem livres escolhas: é somente no recreio que elas podem escolher com quem conversar, o que fazer, aonde ir e até mesmo em qual posição ficar (uma criança não pode ficar de pé ou deitada durante uma aula em escola tradicional se ela quiser, por exemplo). Porém em uma escola em que as crianças são livres o tempo todo, como é a escola em que os meninos frequentam, não há necessidade alguma de um momento específico para que possam exercer sua autonomia. 

Claro que existe um planejamento pedagógico das atividades a serem desempenhadas, principalmente para as turminhas dos maiores. Mas as crianças são convidadas a participar, e não obrigadas. E na maioria das vezes elas decidem, sim, participar. Mas se por qualquer motivo em um dia uma criança não quiser participar de determinada atividade, isso é respeitado. Acredito que não é por uma atividade de colagem ou pintura a menos que uma criança vai ser prejudicada em sua vida futura; mas, ao contrário, acredito que a falta de liberdade e autonomia em tomar pequenas decisões sobre sua própria vida, pode trazer sérios prejuízos na formação da personalidade dessa criança. 

Um dia desses recebemos  o relato diário da escola (todo dia recebemos pelo whatsapp), e uma parte dizia, sobre a turma do Nícolas: " (...) Na aula de artes fizemos o portfólio com tinta guache e pincel. Não concluímos a atividade de registro pois as crianças quiseram correr no gramado. Brincaram no castelinho, com a lona verde, no parque de areia. (...)" Quando li isso, meu coração se encheu de alegria e certeza de que escolhi o lugar certo para deixar meus filhos. Uma escola que tem a sensibilidade de entender que é muito mais importante deixar as crianças fazerem escolhas, e que se a vontade delas é correr no gramado isso é muito melhor para elas do que fazerem uma pintura obrigadas, é a escola dos meus sonhos; não uma que vá transformar meus meninos em gênios da informática ou robótica ou fluentes em 3 idiomas antes dos 10 anos de idade, em troca de suas infâncias...